Artigo produzido pelos advogados Thiago Kunert e Alfredo Ribeiro da Cunha Lobo, sócios deste escritório, e publicado, originalmente, no Poder 360
Nesta 5ª feira (27.jul.2023), celebra-se o Dia Nacional da Prevenção de Acidentes de Trabalho, que ganha ainda mais relevância pelo marco de 45 anos de vigência das NRs (Normas Regulamentadoras) em matéria de segurança e saúde do trabalho. Elas visam disciplinar diretrizes referentes a procedimentos técnicos de segurança laboral.
Na prática, as Normas Regulamentadoras buscam normatizar orientações e recomendações, no âmbito da jornada de trabalho, que asseguram ao trabalhador condições ideais para a execução de suas atividades laborais sob a perspectiva de sua segurança e saúde.
Todavia, muito embora o Brasil possua o status de um dos países mais garantistas do mundo em termos de legislação — sobretudo em matéria trabalhista –, o que se verifica é que, de algum modo, os mecanismos de proteção vêm se mostrando ineficazes nos últimos tempos.
Dados recentes de entidades brasileiras, como o MPT (Ministério Público do Trabalho), e até mesmo da OIT (Organização Internacional do Trabalho), revelam que, em 2022, o índice de mortes decorrentes de acidentes de trabalho sofreu significativo aumento, com patamar 7% superior em relação ao ano anterior.
Mais de meio milhão de acidentes foram registrados dentre os empregos formais – com carteira assinada –, interferindo diretamente no crescimento do PIB do país, assim como em parte da receita das empresas que, por vezes, arcam com pensões vultosas decorrentes de morte por acidente de trabalho.
A questão traz, em princípio, a seguinte pergunta: “De quem é a culpa, Brasil?”.
Nessa linha, destacam-se 3 distintos “personagens” que integram as relações de trabalho e que possivelmente seriam os responsáveis por tal “insucesso” preventivo em matéria de segurança e saúde do trabalho:
- o trabalhador;
- o empregador; ou
- a “cultura brasileira”.
Após quase meio século da edição da 1ª Norma Regulamentadora no Brasil, a sistemática adotada revela-se “falha”, em parte, uma vez que a essência da disposição legal, que é a prevenção de acidentes de trabalho, não vem sendo cumprida.
Em um 1º cenário, a crença é de que os números crescentes de acidentes de trabalho poderiam ser atribuídos exclusivamente aos trabalhadores. Isso porque o regramento legal preventivo existe de modo que, se ainda assim persistem – ou aumentam – o número de mortes, tal fato só poderia decorrer de eventual descumprimento voluntário das normas.
Assim, considerando que as normativas eliminam quase que integralmente os riscos de acidentes de trabalho, então a sua transgressão por parte do trabalhador seria o único fator responsável para o seu aumento.
Todavia, em um 2º cenário, é possível enxergar também que a “ineficiência” das Normas Regulamentadoras nos últimos anos seria fruto da “negligência” das empresas sobre o assunto, uma vez que o obreiro apenas não cumpre com tais diretrizes pois o empregador não lhe dá condições para tanto.
Apesar da existência das Normas Regulamentadoras, muitas empresas optam por não observar tais diretrizes e, assim, não fornecer, por exemplo, EPIs (equipamentos de proteção individual) adequados, além de não fiscalizar as atividades laborais dos trabalhadores ou realizar exames médicos preventivos, entre outros.
Por isso, a culpa recairia aos empregadores que, por sua conduta omissiva ou comissiva, deixam de fornecer espaço ou mecanismos adequados para o trabalho. Além disso, permanecem inertes quanto ao dever de fiscalizar as relações de trabalho estabelecidas.
Há ainda um 3º cenário, que considera o viés cultural do Brasil. O país, por vezes, é conhecido (infelizmente) por seu famoso “jeitinho brasileiro”, ou seja, uma realidade em que ambas as partes burlam o sistema para obter mais vantagens, mesmo sob o risco de maior exposição a acidentes laborais. Nessa hipótese, empregado e empregador optam deliberadamente por transgredir as regras.
A legislação brasileira prevê que a maior fatia da culpa será, em regra, atribuída aos empregadores, visto que eles têm o poder diretivo, assim como a responsabilidade por zelar pelo trabalhador, a parte mais frágil da relação laboral.
Desse modo, a cultura legal de prevenção precisa ser levada para dentro das empresas a fim de minimizar os riscos. Não cabe mais a realidade “reativa” no Direito do Trabalho de esperar o problema para então resolvê-lo.
Fonte: Poder 360